sábado, 16 de novembro de 2013

Psicose: análise de uma cena

Aparecendo aqui para tirar a poeira desse querido blog. Pretendo, sempre que possível, retornar a esse sítio com análises objetivas sobre cinema, HQs, storytelling, animações e demais coisas que curto. Hoje, venho falar de uma cena em específico de um filme. Um trecho do clássico de Alfred Hitchcock, Psicose.

Antes, confesso um pecado: nunca havia assistido um filme do chamado "rei do suspense". Psicose foi o primeiro filme de Hitchcock que assisti na vida e posso dizer que foi um começo com o pé direito. Venho falar um pouco das minhas impressões sobre uma cena em especial do longa-metragem de 1960. Dizem que o diabo se esconde nos detalhes, e creio que avistei o Tinhoso no momento do filme que analiso nesse post. A partir daqui, minha reflexão traz spoilers sobre a trama. Sintam-se avisados.








Na cena, os personagens Norman Bates (Anthony Perkins) e Marion Craine (Janet Leigh) conversam enquanto a jovem se alimenta. Ao redor de ambos, diferentes aves empalhadas olham cadavericamente para a dupla que dialoga. É uma cena longa, tensa, com frases fortes e ataques de opinião de ambos os lados, conversa que perpassa diferentes assuntos, desde a taxidermia aos traumas de Norman em relação à sua mãe superprotetora e muitas vezes violenta.

A cena vai se desenrolando entre perguntas e afirmações. O enquadramento muda de um plano mais amplo para um mais fechado no rosto de Norman. O personagem gagueja, fica nervoso, deixa transparecer uma clássica relação edipiana de ódio e amor pela própria mãe. Evidencia uma personalidade conturbada. Defende a mãe a todo custo apesar de demonstrar certa dor e angústia por ser quem é. No entanto, é a partir do momento em que Marion fala sobre a atitude violenta da mãe de Norman (que aconteceu momentos antes daquela refeição) que o enquadramento da cena se modifica de maneira mais expressiva.



Toda vez que vejo análises sobre composição de cena, fico com um pouco de receio, com aquele tradicional pé atrás que se transforma na pergunta "será que o diretor estava realmente pensando nisso quando filmou desse jeito?" No entanto, tenho convicção que, uma vez feito o filme, o processo de significação chega aos olhos e ouvidos do expectador. E aqui estamos.

Na cena acima, quando Norman começa sua série de defesas à atitude materna, a câmera modifica o ângulo, mostrando um personagem sob as asas de uma coruja. Não seria isso uma mensagem? Quem nunca ouviu falar da expressão "mãe coruja"? De fato, a expressão "mãe coruja" não é presente no vocabulário inglês, mas a atitude protetora da ave é conhecida. Além do mais, é uma coruja morta, empalhada. Não seria uma representação direta dessa relação? Afinal, quem viu o filme até o final, sabe que a mãe de Norman está morta, mas, mesmo assim, tem o filho sob as asas, sob seus cuidados, através de uma personalidade extra na cabeça do personagem.



Outro aspecto que muito me intrigou no enquadramento acontece quando Marion se levanta e se despede de Norman. Instala-se um plongée, enquadramento de cima para baixo, usado no cinema para representar inferioridade, diminuição do elemento filmado. Naquele breve instante, quando Marion vai se retirar, Norman volta a ser criança. Ele diminui, suas sobrancelhas se curvam. Pergunta, quase choramingando, se Marion não quer continuar a conversa.

Diante das negativas de Marion (que, influenciada pelo diálogo com Norman, decidiu retornar ao seu lugar de origem e devolver o dinheiro que outrora havia roubado), o personagem edipiano cede e se despede da mulher que, momentos depois, sucumbiria às facadas mais clássicas da história do cinema.

Com todas as suas nuances, essa cena, para mim, é uma das mais incríveis do filme. O longa é incrível, os cortes realizados na película aumentam a dinamicidade da trama, os movimentos de câmera às vezes são absurdos e me deixaram pensando em COMO conseguiram fazer tais manobras naquela época. Posso ser desconhecedor da obra de Hitchcock, no entanto, não pretendo ser por muito tempo. Psicose é fenomenal, e creio que esse seja o primeiro de muitos filmes do inglês barrigudo que assistirei.



PS: Vez ou outra olhava para o Anthony Perkins e via o Andrew Garfield.


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